A Doença de Parkinson (DP) é uma doença degenerativa do sistema nervoso central, crônica e progressiva. É causada pela degeneração das células da chamada substância negra, uma região do cérebro cujas células produzem a dopamina, substância responsável pela condução das correntes nervosas para o corpo.
A redução ou a ausência de dopamina afeta os movimentos e causa os sintomas. O quadro afeta os movimentos, causando tremores, lentidão, rigidez muscular, alterações na fala e na escrita.
No Brasil, são pouco mais de 200 mil pessoas convivendo com o problema, de acordo com dados da Organização Mundial da Saúde (OMS). Foi pensando em pacientes com essa realidade, que procuram atendimento no Sistema Único de Saúde (SUS), que a especialista Márcia Renata Mortari, da Universidade de Brasília (UnB), desenvolveu uma pesquisa para aprimorar métodos de diagnóstico e avaliar a segurança de novos medicamentos para o controle da doença.
Com fomento da Fundação de Apoio à Pesquisa e Inovação do Distrito Federal (FAPDF), ela coordenou o estudo “Doença De Parkinson Em Foco: aprimoramento de escalas de avaliação cognitiva de pacientes e segurança farmacológica de novos compostos neuroprotetores”.
De acordo com a estudiosa, uma grande limitação para o estudo da progressão da doença, assim como de seu estágio em pacientes atendidos pelo SUS, é causada, em parte, pelo uso de escalas com baixa especificidade, sensibilidade e acurácia que dificultam uma intervenção farmacêutica adequada e uma correta orientação aos familiares, compatíveis com as necessidades dos pacientes. Outra lacuna apontada por ela é a ausência de remédios disponíveis capazes de reduzir ou impedir a evolução da doença.
“Em especial, o diagnóstico precoce dos quadros demenciais pelo rastreio cognitivo é de fundamental importância, pois permite que o apoio ao paciente seja iniciado precocemente, além de possibilitar que o paciente participe das decisões sobre o planejamento futuro de sua vida. Quanto aos medicamentos, Até o momento, fármacos utilizados para impedir a progressão da doença com ação neuroprotetora são pouco estudados e não utilizados no tratamento”, afirma Márcia Mortari.
Por isso, os principais objetivos da pesquisadora foram traduzir, adaptar e aprimorar escalas internacionais de avaliação de sintomas não motores (especialmente cognitivos) para aplicabilidade na avaliação e diagnóstico de pacientes no SUS. Outra vertente do estudo avaliou a segurança de novas fórmulas produzidas com o peptídeo neuroprotetor, composto desenhado a partir do protótipo identificado na peçonha de vespas sociais.
Adaptação de escalas para diagnóstico
Duas escalas foram avaliadas e adaptadas pelos pesquisadores: Escala de Avaliação Cognitiva da Doença de Parkinson (PD-CRS) e Cambridge Neuropsychological Test Automated Battery (CANTAB).
Para avaliação da PD-CRS, foram considerados 640 indivíduos saudáveis (40 anos ou mais) de cinco regiões brasileiras distintas. A escala foi adaptada para o Português e validada através de comparação com testes neuropsicológicos amplamente utilizados: Teste das Trilhas, teste dos Trigrama-consonante, Teste dos Cinco Pontos, Fluência verbal (frutas e animais).
“PD-CRS é uma escala com alta capacidade de triar, discriminar e diagnosticar de forma precoce graus leves de perda cognitiva em pacientes com doença de Parkinson, diferentemente de outras escalas neurocognitivas utilizadas na prática clínica atual”, destaca a coordenadora da pesquisa.
De acordo com os resultados atingidos, a escala demonstrou adequada reprodutibilidade e fidedignidade, podendo ser considerada válida como método diagnóstico. A PD-CRS mostrou-se uma escala com alta capacidade de triar, discriminar e diagnosticar, de forma precoce, graus leves de perda cognitiva em pacientes com doença de Parkinson, diferentemente de outras escalas neurocognitivas utilizadas na prática clínica atual.
Já a CANTAB é uma plataforma digital de mensuração de funções cognitivas com ampla aceitabilidade internacional no meio de pesquisa em neurociência cognitiva e no diagnóstico neuropsicológico. No estudo, ela foi aplicada em 30 participantes voluntários subdivididos em DP-CN (Doença de Parkinson – Cognição Normal) e DP-CCL (Doença de Parkinson – Comprometimento Cognitivo Leve). A escala demonstrou adequada validade do teste cognitivo.
Potencial medicamento
Além da adaptação das escalas para diagnóstico, a pesquisadora também testou a segurança de fórmulas produzidas a partir do peptídeo neuroprotetor, presente na peçonha de vespas sociais.
“Os peptídeos bioativos têm sido excelentes candidatos ao desenvolvimento de novos medicamentos, devido a algumas características da sua atividade biológica, como alta especificidade, potência, baixa toxicidade e diversidades química e biológica. A otimização de peptídeos tem sido muito empregada com o intuito de minimizar problemas inerentes aos peptídeos e viabilizar o uso dessas moléculas como fármacos”, indica Márcia Mortari.
Os resultados do projeto indicaram que a forma injetável foi capaz de reduzir a descoordenação motora e mostrou ação neuroprotetora de neurônios produtores de dopamina na substância negra do cérebro (substantia nigra).
“Este estudo tem revelado que é promissor capaz de prevenir a progressão da doença e perda neuronal”, afirma Márcia Mortari.
A cientista destaca, ainda, que o peptídeo neuroprotetor teve todo o seu perfil de segurança farmacológica avaliado em roedores e primatas, tendo sido bem tolerada sem geração de feitos adversos. Ela ressalta as vantagens do uso da substância, como alta potência, excelente seletividade, baixa toxicidade química e imunogenicidade.
Quanto à importância e aplicabilidade da pesquisa para o SUS, Mortari explica que a disponibilidade de um fármaco neuroprotetor é inexistente até o momento e que “os resultados poderão revolucionar a terapia de desordens neurodegenerativas, proporcionando uma melhora significativa para os pacientes e diminuindo os custos diretos e indiretos no SUS”.
A pesquisa foi fomentada pela FAPDF “Chamada FAPDF/MS-DECIT/CNPQ/SESDF 01/2016 – Programa de Pesquisa para o SUS: Gestão Compartilhada em Saúde”, cujo objetivo foi apoiar a execução de projetos de pesquisa científica, tecnológica e de inovação que promovam a formação e a melhoria da qualidade da atenção à saúde no Distrito Federal, no contexto do Sistema Único de Saúde (SUS).
FONTE: JORNAL DE BRASÍLIA