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A próxima ameaça de pandemia provavelmente já está se espalhando entre humanos enquanto você lê este texto. Quem afirma é Maureen Miller, professora de Epidemiologia da Universidade de Columbia, nos Estados Unidos.

Ela desenvolveu um sistema de alerta para vigilância de ameaças de pandemia, com financiamento da agência de desenvolvimento americana USAID. Sobre o tema, ela escreveu um artigo para o site The Conversation.

Vigilância de ameaças potenciais pode prevenir novas pandemias.
fonte: Martin Sanchez/Unsplash 

Maureen descobriu que há uma estratégia simples para mitigar surtos emergentes: vigilância de ambientes em que a disseminação de doenças de animais para humanos seja mais provável de ocorrer – de forma proativa e em tempo real. Ela acredita que não se deve esperar doentes aparecendo em hospitais, mas sim monitorar as populações em que o contágio de doenças realmente acontece.

O problema das zoonoses

A transmissão de doenças de animais para humanos sempre foi um problema. Em 1947, a Organização Mundial da Saúde (OMS) criou uma rede global de hospitais para detectar ameaças de pandemia por meio de um processo denominado “vigilância sindrômica”: a verificação de sintomas padrão em busca de sinais de doenças emergentes ou reemergentes com potencial pandêmico. A estratégia depende de indivíduos infectados e de autoridades médicas para soar o alarme.

Para esse modelo, Maureen afirma que há um obstáculo: “No momento em que um doente chega ao hospital, já ocorreu um surto”. No caso do SARS-CoV-2, o vírus que causa a covid-19, a estratégia clínica, por si só, falhou. Segundo a pesquisadora, uma abordagem mais proativa está ganhando destaque no mundo da prevenção de pandemias: a teoria da evolução viral.

A teoria sugere que vírus animais se tornam vírus humanos gradativamente, através de transbordamentos zoonóticos, com um animal intermediário – como uma civeta, pangolim ou porco – transformando o vírus, permitindo que ele faça os primeiros saltos para humanos. “Mas os hospedeiros finais que permitem que uma variante se torne totalmente adaptada aos humanos devem ser os próprios humanos”, lembra a professora.

Para ela, estamos acompanhando a teoria ao vivo, com as variantes da covid-19. Recentemente, uma equipe internacional de cientistas propôs que a transmissão não detectada de humano para humano, após um salto de animal para humano, é a provável origem do SARS-CoV-2.

Ebola: Estudo de caso

Imagem: Nick Youngson

O Ebola apareceu primeiro na década de 1970 e a pesquisa sobre transmissão da doença se baseou em testes de anticorpos e exames de sangue. Na época, foram feitos testes de populações-alvo e os anticorpos foram encontrados em mais de 5% das pessoas testadas na Libéria, em 1982 – décadas antes da epidemia da África Ocidental, em 2014. Esses resultados apoiam a teoria da evolução viral: pode levar muito tempo para que um vírus animal perigoso se torne transmissível entre humanos.

Para a cientista, o achado significa que os cientistas têm uma chance de intervir antes de a doença se tornar uma pandemia global, por meio da vigilância repetida de longo prazo. “Configurar um sistema de alerta de ameaças de pandemia com essa estratégia em mente pode ajudar a detectar vírus pré-pandêmicos antes que se tornem prejudiciais aos seres humanos. E o melhor lugar para começar é diretamente na fonte”, afirmou a autora do sistema.

Sistema de alerta para ameaças pandêmicas

A equipe de Maureen trabalhou com o virologista Shi Zhengli, do Instituto de Virologia de Wuhan, em um ensaio de anticorpos humanos, testando um primo muito distante do SARS-CoV-2 encontrado em morcegos. Eles estabeleceram provas de transbordamento zoonótico em uma pequena pesquisa sorológica de 2015 em Yunnan, na China: 3% dos participantes do estudo que moravam perto de morcegos portadores do coronavírus semelhante à SARS testaram anticorpos positivos.

Representação 3D do Coronavírus

Houve um resultado inesperado: nenhum dos participantes do estudo previamente infectados relatou quaisquer efeitos prejudiciais à saúde. “O derrame anterior de coronavírus SARS – como a primeira epidemia de SARS em 2003 e a Síndrome Respiratória do Oriente Médio (MERS) em 2012 – causou altos níveis de doença e morte. Este não fez tal coisa”. Entre 2015 e 2017 realizaram novo estudo no Sul da China e menos de 1% dos participantes testaram positivo para anticorpos.

O estudo forneceu a evidência biológica necessária para estabelecer uma prova de conceito para medir o transbordamento zoonótico – o sistema de alerta de ameaças de pandemia também detectou um sinal de infecção do tipo SARS que ainda não havia sido detectado por meio de exames de sangue. “Pode até ter detectado variantes precoces do SARS-CoV-2”, disse Maureen.

Se os protocolos de vigilância estivessem em vigor, os resultados teriam desencadeado uma busca por membros da comunidade que podem ter feito parte de um surto não detectado. Mas, sem um plano estabelecido, o sinal foi perdido. A esperança é que agora o sistema dê conta de detectar novas ameaças antes que elas atinjam todo seu potencial. “A boa notícia é que já existe infraestrutura de vigilância em ‘pontos críticos’ globais”, salientou Maureen.

FONTE: THE CONVERSATION

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