“Doença neurodegenerativa rara afeta principalmente as capacidades relacionadas à linguagem.”
No vocabulário médico, o termo afasia significa distúrbio de linguagem. A condição pode estar relacionada a diferentes fatores, como acidente vascular cerebral (AVC), traumas ou tumores. Afasia Progressiva Primária (APP), por sua vez, é uma doença neurodegenerativa caracterizada como um quadro de demência progressiva, cujo principal acometimento é a linguagem. A doença provocou a morte da promotora de eventos Alicinha Cavalcanti, de 58 anos na segunda-feira (02.08.2021).
“A doença impacta a habilidade de falar, compreender, nomear, ler e escrever. Tudo isso é o que compreende a linguagem do ser humano. A afasia progressiva primária inicia o quadro neurodegenerativo pegando a linguagem como a principal característica.”
Explica o neurologista Diogo Haddad, da Unidade Campo Belo do Hospital Alemão Oswaldo Cruz.
De forma diferente de outras doenças neurodegenerativas como o Alzheimer, que afeta principalmente os recursos da memória, os primeiros sintomas da afasia progressiva primária podem surgir como sinais de dificuldade para completar frases, nomear objetos, além de alterações na fluência da fala.
O neurocirurgião e neurocientista do Hospital das Clínicas de São Paulo, Fernando Gomes, explica que a manifestação clínica ocorre por acometimento degenerativo de neurônios e circuitos neurais presentes na região frontal do cérebro.
“A adoção de um estilo de vida saudável e o estímulo das funções mentais podem ajudar em síndromes demenciais como a afasia progressiva primária”, afirmou Gomes.
Causas são incertas:
O neurologista do Hospital Alemão Oswaldo Cruz explica que, assim como as demais doenças neurogenerativas relacionadas à demência, a afasia progressiva primária não tem uma causa específica. “Não sabemos o que é o ponto de gatilho que leva ao desenvolvimento da doença. Temos uma ideia de como é a fisiopatologia de todas as doenças, mas não sabemos o estímulo, a explicação do porquê algumas pessoas têm e outras não”, afirmou.
Segundo Haddad, as causas são consideradas multifatoriais. O desenvolvimento da doença inclui características genéticas e fatores externos relacionados ao ambiente, como tabagismo e doenças prévias, como diabetes, hipertensão e outros agravos cardiovasculares.
Para realizar o diagnóstico, primeiro é preciso descartar a hipótese de que se trate de alguma doença que possa ter sintomas semelhantes. Em um segundo momento, o paciente é submetido a uma investigação de escalas cognitivas para constatar as alterações de linguagem. Por fim, exames de imagem, como a ressonância magnética e a tomografia computadorizada (PET-CT), podem indicar o local afetado do cérebro e contribuir para o diagnóstico.
Doença é rara, porém de rápida evolução:
Segundo o neurologista Diogo Haddad, a afasia progressiva primária é uma doença rara, que pode acometer de 1 a 9 pessoas a cada 100 mil indivíduos. Diferentemente de outras doenças relacionadas à demência, a afasia progressiva primária pode atingir pessoas mais jovens, incluindo a faixa etária abaixo de 65 anos e acima de 45.
“É uma doença mais agressiva que o Alzheimer, que tende a evoluir ao longo de muitos anos. Muitas vezes, ao longo de 5 a 10 anos, no máximo, o paciente já tem uma baixa qualidade de vida e uma dependência importante para as atividades diárias”, disse.
Não existe tratamento específico:
Não existem tratamentos à base de medicamentos que permitam reverter, abrandar ou curar a afasia progressiva primária. Segundo o neurologista Diogo Haddad, alguns medicamentos podem minimizar impactos decorrentes dos sintomas da doença.
A reabilitação e o acompanhamento médico a longo prazo podem trazer benefícios para a saúde dos pacientes. O trabalho multidisciplinar conta com a colaboração de fonoaudiólogos, psicólogos e neurologistas. “A reabilitação demanda uma equipe multidisciplinar importante, que consegue fazer, de acordo com o perfil de cada paciente, uma reabilitação cognitiva voltada à linguagem, que faça com que o paciente aprenda a lidar com a dificuldade”, disse Haddad.
Segundo ele, o estímulo dos aspectos linguísticos comprometidos e preservados minimiza o impacto da realização das atividades básicas a longo prazo. Os exercícios e a atividades da reabilitação podem variar de acordo com o quadro clínico de cada paciente.
Doença não tem cura:
Apesar das melhoras da condição de saúde possibilitadas pela reabilitação, a afasia progressiva primária não tem cura. O risco de morte está relacionado principalmente às complicações ocasionadas pela neurodegeneração.
“O paciente passa a ter alterações não somente de linguagem e de fala, mas também alterações na deglutição, dificuldade para respirar sem aspiração. São pacientes que acabam tendo muitas hospitalizações e tratamento de infecções recorrentes. Isso prejudica muito a saúde, por isso, muitas vezes a morte é relacionada aos sintomas que a doença provoca”, conclui.
FONTE: CNN BRASIL (SAÚDE)